nome: Mariana Pires Afonso
ano de nascimento: 1922
local: Sobral da Adiça
freguesia: Sobral da Adiça
concelho: Moura
acervo: António Ferreira Lopes
transcrição:

[Era]um galo e uma galinha, depois à noite ouviom os donos estarem a conversar a dezer assim:

–– Ai, vem aí o Natal e matemos a nossa galinha e o nosso galo.

E diz a galinha p’rô galo:

–– Ai compadre galo, vamos embora qu’ eles querem-nos matar p’rô, agora p’rô Natal, e a gente vai correr o mundo.

Foi, forom-s’ embora, forom a correr o mundo, forom a dromir em cima duma, duma p’rêra. (...) Por essa noite a fora, diz a galinha:

–– Ai, compadre galo, vamos embora que está caind’ o cé’ a pedaços.

–– Atã quem te disse comadre galinha?

–– Nã me disse ninguém, mas já me caiu um pedacinho na minha garopitinha.

E forom, sairom e forom-s’ embora. Era uma pêra que lhe caiu em cima da cabeça e ela dezia qu’ era o céu a pedaços. Chegom mais adiante, encontrom dois patos.

–– Atã qu’ andom fazendo compadres patos?

–– Ora, a gente vamos a fugir porqu’ os mês patrões tamém me querem matar p’rô Natal, e agora...

–– Venhom com a gente, vamos a correr o mundo.

Forom a correr o mundo, forom com eles, forom todos. Vai mais adiante, encontrom um burro. Diz:

–– Atão, onde vão?

–– Olha, vamos a correr o mundo.

–– Olha, ê tamém vou qu’ o mê patrão quer-me vender ôs ciganos. –– e foi com eles.

Vão mais adiante, encontrom um gato. Diz:

–– Atão compadre gato?

–– Eu venh’ a fugir dos mês donos, qu’ eles querem-me dar, e ê nã quero.

–– Atão anda com a gente a correr o mundo.

Forom todos a corrê o mundo. Chigarom a um monte e ficarom lá. Diz:

–– Olha, as galinhas vão (...) p’rá chaminé, o gato fica aqui na cinza, os carnêros...

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–– Tamém são os carnêros? [Contadora]

–– Parece que eram patos. [ Colector]

–– Erom os patos, bom mas tamém iom uns carnêros. Tamém virom dois carnêros, e forom tamém. [Contadora]

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... os carnêros ficom ô pé da porta, e o burro fica lá na cabana. Lá ficou...

Os ladrões dizem:

–– Ai, vamos a assaltar aquele monte (...) e um vai a ver primêro o que lá está, e ôtros ficom aqui à ’spera.

Vai o primêro, cond’ entrou, os carnêros derom-lhe log’ uma marrad’ assim,1 qu’ ele ficou (...), foi à chaminé, foi ácender o lume, viu as orelhas do gato, o gato dê’-lh’ ’ma sapatada na cara, olha lá p’ra cima e foi os ôtros (...) em cima da cara. Vai, ele diss’:

–– Ai, ê vou lá à cabana vê’ se vejo...

’Tava lá o burro, dê-lh’ dôs côces’ e ele ficou... E depois veio:

–– Ai, calem-s’ a gente nã pod’ ir lá b’scar o ouro (?). Está lá o ... Olhem: está, estã’ primêro dois ferrêros à porta, derom-me logo duas, duas marteladas. Vou a olhar p’ra cima, estão lá corvos na chaminé, e está um sapatêro ali debaxo da chaminé, deu- -me com as cardas na cara, e depois venh’ á cabana estava lá um, um ferrador, dê-m’ aqui com as ferraduras nas costas... O qu’ era, era uns bonzinhos que lá andavom. Deziom: «Passo passo de cavalhêro, passo passo de cavalhêro.» Esses é qu’ erom bonzinhos. –– erom os patos. –– E estava lá um na chaminé que dezi’ assim: «Tragom- -mo cá! Tragom-mo cá!» — er’ ô galo cantando. –– Aquilo até (...) matavom-me logo... Com qu’ o melhor é a gente não ir lá.

Com que nã’ forom antão assaltar o monte, e ’ esta hora lá estarão comendo pã’ com melão.2

 

1- A contadora cerrou os punhos e fez um gesto em que os pôs um contra o outro.

2- Risos da contadora.