Inventário PCI

O Noivado do Sepulcro

Vimioso

"O Noivado do Sepulcro" -  Sobre um amor eterno, uma paixão, que se mantém para além da morte – na mesma sepultura são encontrados dois esqueletos.

 

 

Adélia Augusta, 1933. Caçarelhos.

Registo 2010.

Cancioneiro Poema de Soares de Passos

Transcrição

Noivado do Sepulcro

 

«Vai alta a lua na mansão da morte. Já meia-noite com vagar soou. Que a paz tranquila, nos vaivéns da sorte, só tem descanso quem ali baixou. [Bis:]

Que a paz tranquila, nos vaivéns da sorte, só tem descanso quem ali baixou.

Que a paz tranquila!... Mas a  longe, a longe, funéra(1) campa com fervor rangeu. Branca fantasma semelhou num monge, dentro do sepulcro a cabeça ergueu.

Ergueu-se, ergueu-se! N’ emplidão(2) celeste campia(3) a lua com sinistra a luz. O vento geme no fera(4)(?) cipreste e o mocho pia no mármore da cruz. Ergueu-se, ergueu-se! Com sombrio espanto, olhou em roda, não achou ninguém... Por entre as campas, arrastando o manto, com lentos passos caminhou além. Chegando perto duma cruz alçada, por em cipreste revejava ao fim, parou, sentou-se, com voz magoada, cos(5) ecos tristes acordou assim: ? Mulher formosa, que adorei na vida, e que na tumba não cessei de amar, pra que m’ atraiçoas, desleal, mentida(6), o amor eterno que te vi jurar? Amor, engano que na campa finda, que o mundo despe de ilusão fatal. E que os vivos se lembram ainda do pobre morto que na terra jaz? Abandonada, neste chão repouso, há já três dias e não vens aqui... Ai, quão pesada me tem sido a lousa(7) sobre este peito que abateu por ti! Ai, quão pesada me tem sido! E meio, a frente injusta lhe pendeu na mão, grandes soluços lhe arrancou do seio, dando suspiros de cruel paixão. Talvez que nunca, dos protestos nossos, gozes com outro, em prisão, prazer. Mas o olvido cobrirá meus ossos na terra fria sem vingança ter! Depois, mais tarde, quando foi volvida da sepultura o gelado pó, dois esqueletos, um ao outro unidos, foram achados num sepulcro só.

 

[Bis:]

Dois esqueletos, um ao outro unidos, foram achados num sepulcro só.»

 

Adélia Augusta Pires Garcia, Caçarelhos (Vimioso),Outubro de 2010

 

Glossário:

 

(1) Funéra – funérea, fúnebre.

(2) N’ emplidão – na amplidão (por hipótese).

(3) Campia – campeia, sobressai.

(4) Fera – feral (por hipótese), funéreo, fúnebre; lúgubre.

(5) Cos – ‘com os’ (contração da conjunção arcaica ca com o artigo ou pronome os ? ca+os ?; uso oral, coloquial).

(6) Mentida – falsa, ilusória, vã.

(7) Lousa – placa de pedra que cobre a sepultura, lápide funerária.

Referências bibliográficas e recursos online utilizados no glossário: http://aulete.uol.com.br; http://www.ciberduvidas.com; http://www.dicio.com.br; http://www.infopedia.pt; http://www.priberam.pt

Caraterização

Identificação

Tradições e expressões orais
Manifestações musicais e correlacionadas
O Noivado do Sepulcro
1933
Adélia Augusta
Trabalhadora agrícola reformada

Contexto de produção

Contexto territorial

Caçarelhos, Vimioso, casa de Francisco Augusto
Caçarelhos
Vimioso
Bragança
Portugal

Contexto temporal

2010
Hoje sem periodicidade certa. Encontros informais e iniciativas do Município de Vimioso

Património associado

Transmitidas aos serões, em quotidianos de trabalho e lazer.

Contexto de transmissão

Estado da transmissão
ativa
Descrição da transmissão
Agentes de tramissão

Residentes do concelho de Vimioso que são convidados para iniciativas do Município e Biblioteca de Vimioso. Principais actividades desenvolvidas que estas manifestações culturais:

Sons e Ruralidades em Vimioso

ANAMNESIS - Encontro de Cinema, som e tradição oral.

Feira de artes, ofício e sabores

(ver links em documentação)

Idioma
Português

Equipa

Transcrição
Maria de Lurdes Sousa
Registo vídeo / audio
José Barbieri
Entrevista
José Barbieri e Filomena Sousa
Inventário PCI - Memoria Imaterial CRL