Inventário PCI
Beja
“A morte da condessa”- Uma princesa perversa que quer casar pede ao rei que mande um conde matar as sua esposa para que com ela possa casar.
Idalina Cocito; St. Clara de Louredo; Ano de nascimento: 1938; Concelho de Beja.
Registo 2010.
Transcrição
«Era um pai que tinha sete filhas e ó depois casaram todas. Só ficou uma, que era a mais velha, que era Maria. (E tinha um Conde, que trabalhava pò(1)rei…).
Dizia o rei:
? O que queres tu, minha filha? O que queres, Dona Maria?
- Sete filhas que o me’(2) pai teve, só sou eu a solteirinha…
? Como queres qu’ eu te case com tamanha assenhoria(3)? –
Com o Conde, real Conde, que é casado e tem família?
? Manda-o, meu pai, chamar, pelo criado que havia.
Ainda a reza não é dita, já quando à porta batia.
? Vossa Alteza que me quer? Vossa Alteza que me queria?
? Quero que mates a Condessa e cases com Dona Maria.
? A condessa na’ mato eu, que’la(6) a morte na’ merecia!
Mandára(7) pòs pais, que ainda a aceitaria!
? Mata-a Conde, mata-a Conde, não me tomes(?) demasias.
Quero que tragas a cabeça nesta dourada bacia.
O conde assim que ouvi chorando e lamentando pà(8) sua casa seguiu.
(…) Assim que lá chegou (…) a condessa lhe sorriu.
? Não! Não sorrias condessa. Não, não sorria para mim,
(…) A tristeza que me vale? Sou obrigado a casar com ela!
E ela tinha (…) tinha tido um menino com um mês.E ó’pois ela dizia:
? Mandai-me pra me’s pais! Ou mandai-me pràs brinhas(10), que os bichos me comeriam?
? Isso não, condessa! Não, que isso tudo ela adiria(11)!
Quer que leve a sua cabeça nesta dourada bacia. ? Nesta excomungada bacia, dizia ele!
Lá abalou pa’ ir casar com a (condessa) [princesa].
Ela, coitadinha, ficou no jardim muito triste. No outro dia (…) ia ser morta. (…) ‘Tava(12) dando de mamar ao mocinho e dizia assim:
- Mamai, me’ filho, mamai esta pinga de Veneza,
que amanhã, por estas horas, és filho de uma princesa!
E ó’pois o mocinho dava outra volta, dizia:
- Mamai me’ filho, mamai esta pinga de amargura,
que amanhã, por estas horas, ‘tá a tua mãe na sepultura.
Mas quando isto, ouviu-se o sino da corte. E diz ela assim:
- Ouve-se o sino da corte ? Ai meu Deus, quem morreria?!
Respondeu uma criança que ainda falar na’ sabia!
? Morreu a cria do rei chamada Dona Maria.
Descasar os bens casados, foi coisa que Deus na’ queria!
Morreu e nunca casou. E ele sempre ficou com ela! Né(13) engraçado, estas coisas assim? Né?»
Idalina Cacito, Beja, Abril de 2010
Glossário:
(1) Pò – “para o”, forma sincopada de prò (contração da preposição pra com o artigo ou pronome o), uso popular e coloquial.
(2) Me’ – meu (redução para reprodução da pronúncia, uso informal e coloquial).
(3) Assenhoria – senhoria ? tratamento que se dava à alta nobreza; excelência.
(4) Na’ – “não” (pronuncia popular, uso coloquial).
(5) Ó’pois – “depois” (modo informal e coloquial, reprodução da pronúncia).
(6) Qu’ela – que ela.
(7) Mandará – mandai-a; mande-a (verbo mandar, pronúncia popular).
(8) Pà ?“para a” (abreviatura oral, de uso informal e coloquial).
(9) T’isteza – tristeza.
(10) Brinhas – brenhas (manteve-se a pronúncia) – mata espessa; matagal.
(11) Adiria – percebia, juntaria, somaria os factos (neste caso específico).
(12) ‘Tava –estava ( pronúncia popular do verbo “estar” conjugado).
(13) Né? – não é? Contracção do advérbio ‘não’ e da forma verbal ‘é’ – “não é”?
Referências bibliográficas e recursos online utilizados no glossário:
http://aulete.uol.com.br; http://michaelis.uol.com.br;http://www.ciberduvidas.com; http://www.infopedia.pt; http://www.priberam.pt
Caraterização
Identificação
Contexto de produção
Contexto territorial
Contexto temporal
Património associado
Contexto de transmissão
Contadores de histórias que participam em iniciativas do Município de Beja. São convidados na iniciativa Palavras Andarilhas. Vão a escolas, lares e bibliotecas.