Inventário PCI
Beja
“Hortense e o rapaz”-O filho de um patrão aproveita a saída dos pais para tentar seduzir a criada.
Mariana Bicho; Salvada; Ano de nascimento: 1938; Concelho de Beja.
Registo 2010.
Cantiga Narrativa
Fonte: Carlos Nogueira (IELT)
Transcrição
[Hortense e o rapaz]
«(…) A Hortense.
A senhora ia sair (…) ia dar um passeio com o marido, mas ela tinha um filho e chamava-se Abel.
E a senhora chama-me, que é para ir regar as flores.
- Ah, ‘tá(1) muito bem. ‘Tá bem.
Ela chamou. (…) Ela alevantou-se(2). Foi regar as flores, depois da senhora abalar(3). (…) ‘Tava na varanda, chega-le(4) ele ao pé.
- Bom dia, menina Hortense!
Minha linda jardine’ra(5),
anda regando as flores,
sendo a sua a verdadeira.
Tens uma flor contigo
*Que a minha estava em cegueira*(?)?
Bom dia, senhor Abel,
que me faz que admirar!
Vossa excelência a esta hora
no jardim a passear?
Com o ar da manhegia(?)
até se pode constipar!
Mal sabes tu, Hortense,
o que me fazes sentir!
Eu ouvindo o regador
tenho que do quarto sair.
Tu tens uma flor
que na’(6) me deixa dormir.
(…) Essa flor
Que tão cedo o faz erguer.
O seu (…)
o senhor a encolher.
A flor que o meu peito estima,
Hortense, vou dizer:
‘tá do embigo(7) pra(8) baixo
(…) dos verdes para cima.
Tã’(9) em boa ocasião
que te encontro aqui sozinha.
(…) Senhor Abel,
isso é que na’ pode ser!
A flor que eu aqui tenho
é pra quem me receber.
Hortense, na’ digas que não.
Ainda fico mais desmorecido(10).
*Morro isto tal de paixaço*(?)
se na’ me abraço contigo.
Ai na’ se abraça, na’ percebe?
Que eu hei-de me retirar.
Se o senhor tem muita calma,
venha pò(11) tanque banhar.
Belas melancias!
Quem me dera chegar à rama!
Queria-me abraçar com elas
no leito da tua cama.
O leito da minha cama
‘tá com pouca gavidade.
Vá pa’(12) outras mais bonitas
que usam da sua maldade. (…)
Mariana Bicho, Beja, Outubro de 2010
Glossário:
(1) ‘Tá – “está”? pronúncia popular do verbo “estar”, uso informal e coloquial.
(2) Alevantou-se – o mesmo que levantou-se.
(3) Abalar – ir embora.
(4) -Le – ‘lhe’ (pronome, registo popular e modo informal).
(5) Jardine’ra – jardineira (houve supressão do i para manter a pronúncia).
(6) Na’ – não (pronuncia popular, uso coloquial).
(7) Embigo – umbigo.
(8) Pra – “para” (redução da preposição “para”, sua forma sincopada,usadano registo popular, informal - reprodução da pronúncia).
(9) Tã’ – tão.
(10) Desmorecido – esmorecido (desanimado).
(11) Pò – “para o”, forma sincopada de prò (contração da preposição pra com o artigo ou pronome o), uso popular e coloquial.
(12) Pa’ – “para” (em próclise, usadode modo informal e coloquial).
Referências bibliográficas e recursos online utilizados no glossário:
Barros, Vítor Fernandes & Guerreiro, Lourivaldo Martins. (2005). Dicionário de Falares do Alentejo. Porto: Campo das Letras. p.19.
Barros, Vítor Fernandes, (2006). Dicionário do Falar de Trás-os-Montes e Alto Douro. Lisboa: Edição Âncora Editora e Edições Colibri, p.254.
Barros, Vítor Fernandes, (2010). Dicionário de Falares das Beiras. 1ª. Edição. Lisboa: Âncora Editora e Edições Colibri, p. 15.
Chaves, Luís. (1916).Folclore de S.ta Vitória do Ameixial. Volume XIX. Lisboa: Livraria Clássica Editora, p.314.
http://acll.home.sapo.pt/portugues.html; http://aulete.uol.com.br; http://michaelis.uol.com.br; http://www.ciberduvidas.com; http://www.infopedia.pt; http://www.priberam.pt
Caraterização
Identificação
Contexto de produção
Contexto territorial
Contexto temporal
Património associado
Transmitidas aos serões, em quotidianos de trabalho e lazer.
Contexto de transmissão
Contadores de histórias que participam em iniciativas do Município de Beja. São convidados na iniciativa Palavras Andarilhas. Vão a escolas, lares e bibliotecas.