Inventário PCI

O rancho

Torres Vedras

"O rancho"- Relato de um episódio em que uma mulher foi perseguida por um vitelo no rancho onde trabalhava.

Maria da Restauração, Ano de nascimento 1936,Matacães, Torres Vedras, Registo 2010.

Episódio de história de vida

Transcrição

O rancho

 

Eu tinha dez anos quando fui para Vila Franca, para o arroz; arranjar chão para arroz. Arranjar chão e depois dispor, não é? E nós dormíamos numa casa casa ampla, digamos, como esta. Mas ficava longe do trabalho, saíamos de manhã e vínhamos à noite. E depois como aquilo era muito longe, o que é que o patrão destinou? De arranjar assim uma cabana qualquer mais no sítio do trabalho para a gente lá ir. Íamos para lá na Segunda e vínhamos à Sexta para o quartel.

Aquilo era feito com caniços e era… Como sabem, em Vila Franca havia muito gado bravo. Agora já não há tanto, não é? Mas antigamente havia muito gado bravo. Quer dizer, depois era assim: a gente lá dentro da cabanazeca e os bois com os cornos enfiados a furar os caniços! E a gente, quer dizer… Aquilo era no meio do campo e a gente para fazer xixi tínhamos que vir à rua, não é? Durante a noite. E depois, e depois? Eles andavam ali de roda, de roda da cabanazeca e a gente às vezes lá íamos duas e três a espreitar… Agora ia uma fazer, depois ia outra fazer. E lá fazíamos aquilo. Depois quando nós de manhã nos levantávamos para ir para o trabalho, os animais andava ali tudo de volta. A gente depois era de gritar! Gritar para nos virem tirar os bois que a gente queria ir para o trabalho. Quer dizer, o caseiro é que chamava o pessoal.

Bem, havia lá uma vaca que tinha um vitelozinho e vai correr atrás de uma tia minha. E o homem que tomava conta do gado:

- Deite-se, deite-se, deite-se!

Porque quer dizer, o animal, se a pessoa se deitar e não respirar, ele esgravata mas pensa que a pessoa está morta e vai-se embora. E ele diz:

- Deite-se, deite-se!

Ela deitava-se mas era uma gaita! Não se deitava. Cada vez corria mais! Corria mais, mas a mulher lá se desengonçou e caiu. Caiu e depois a vaca, quer dizer, esgravatou, esgravatou, foi-se embora. Foi-se embora e aquilo depois chegou o […] e sacudiu-a. Mas ela diz:

- Ai, filhas… Ai, filha, que eu ia morrendo aqui com um susto tão grande…

E depois diz ela assim:

- Ai, ó senhora minha tia, está morta! Ai, ó senhora minha tia, está morta!

E de maneira que depois ela diz assim:

- Eu nunca mais para aqui venho! Nunca mais para aqui venho!

Mas a gente precisava de ganhar o pão para comer. Eu era caneca, tinha dez anos quando para cá vim. Ela é que, pronto, já era uma mulher feita, não é? E então ela é que mais ou menos vinha tomar conta de mim e da minha irmã, porque ela era irmã do meu pai. Mas aquilo… Mas o homem:

- Deite-se, deite-se!

- Eu deito-me mas é uma bola!

 

 

Maria da Restauração , Torres Vedras, Registo 2010.

 

 

 

Caraterização

Identificação

Práticas sociais, rituais e eventos festivos
Agricultura e silvicultura
O rancho
1936
Maria da Restauração

Contexto de produção

Contexto territorial

Matacães
Matacães
Torres Vedras
Lisboa
Portugal

Contexto temporal

2010

Património associado

Contexto de transmissão

Estado da transmissão
ativa
Descrição da transmissão
Agentes de tramissão

Encontros em festas e actividades promovidas pelo Município e Junta de Freguesia

Idioma
Português

Equipa

Transcrição
Ana Sofia Paiva
Registo vídeo / audio
José Barbieri
Entrevista
Filomena Sousa
Inventário PCI - Memoria Imaterial CRL