Inventário PCI
Beja
“A princesa magalona”- Um rei vai para a guerra e sua mulher é enganada por um tio, ficando sem nada, e indo viver para a mata com a descendência. Anos depois dar-se-á o reencontro real e os maus serão castigados.
Idalina Cocito; St. Clara de Louredo; Ano de nascimento: 1938; Concelho de Beja.
Registo 2010.
Contos Maravilhosos: Ciclo “A Esposa Banida”: próxima do tipo 706 A Menina sem Mãos, fragmentada.
Classificação: Isabel Cardigos (CEAO/Universidade do Algarve) em Setembro de 2011 Fonte da classificação: Fonte da Classificação: Isabel Cardigos, Paulo Correia, J. J. Dias Marques, Catalogue of Portuguese Folktales, “F.F. Communications nº 291 “ Academia Scientiarum Fennica, Helsínquia, 2006. Elaborado a partir dos catálogos internacionais, nomeadamente o “Aarne-Thompson” (The Types of the Folktales, “F.F.C. nº 184, Helsínquia1961) e a recente reformulação de Hans-Jörg Uther, The Types of International Folktales: A Classification and Bibliography, “F.F.C. 284-286”, Helsínquia 2004.Foi utilizada a reformulação portuguesa ampliada, ainda inédita. Observações: O título “A Princesa Magalona” (dado pela entrevistada) está sobretudo associado a um conto novelesco derivado de livros de cordel que, aparte o registo novelesco, não se relaciona com a história lembrada por Idalina Cacito.
Transcrição
A Princesa Magalona(1)
Porque era também um rei que foi pa’ (2) guerra. E ela ficou, a mulher ficou. (…) Era o Rei Rondão. (…). - Nesse tempo, iam prá guerra, pois os reis iam prás Franças, prás Alemanhas, pa’ esses lados, pá guerra.
E depois ela, coitadinha, ficou cá. Ficou com um tio *violento/dileito[direito]*(?),[que] ficou tomando posse dela. Depois (…) disseram que o homem que tinha morrido. Ela, coitadinha, pois ficou sem nada, puseram-na… À margem!
E ela, pa’ onde é que ela havia de ir?! Par’(3) dent’o(4) duma... E ‘tava(5) com a bebé, ‘tava com a menina… (...) Foi, ficou na mata. Nesse tempo, havia muita mata e ficou lá, dentro de um buraco. E quem a ajudava sempre era um macaco. (…)
Teve um menino lá, (…) mas o menino nunca saía. ‘Tava na cela, não saía com ela... (…) Bom, (…) pois se ela, coitadinha ficou lá... Do lado de lá, muitos anos, muitos anos! E depois iam lá à caça. Os caçadores iam à caça e tudo...
Passou-se esses anos todos, já o mocinho era grande e ela, coitadinha, lá ‘tava sem roupa, sem nada… Andava só vestida com trapos e com coisas… E havia lá pêlos e essas coisas. E depois os macacos (…) faziam com pêlos e ela vestia-se com pêlos(?)... Dizia assim: - Bom... – E ‘tava despida, mas também! Pois havia de ser na mata, havia de andar despida também, pois, coitada.
(…) O homem chegou da guerra, soube que a mulher, qu’o(6) tio qu’a(7) tinha levado prás(8) brenhas(9). Por causa disso, mandou matar o tio. E ele meteu-se em casa com um grande desgosto. Morrer com a paixão da mulher de na’(10) ‘tar. Um g’ande(11), g’ande desgosto!
(…) Ó’ pois(12) ele, um dia, um colega dele disse assim:
- Ai, não! Tu não te podes te pôr assim! Vamos à caça. Vamos fazer uma caçada!
«Vamos fazer uma caçada» - andavam caçando, quando vêem um mocinho... - (…) O mocinho tinha aí uns dez ou catorze anos, uma coisa assim. Mas, coitadinho, andava despido aquele mocinho. - Foram fazer uma caçada, aquelas brenhas, viram o menino. Eles apanharam-no! O mocinho, ele pouco sabia falar! ‘Pois(13) eles disseram:
- Escuta...
(…) - O moço era tal e qual a cara do pai e disse assim:
- Pareço a vossa cara!
Disse logo outro: - Ma’(14) me’mo(15) porco e tudo! - Coitadinho, o mocinho, com aquela coisa de ‘tar lá com os bichos, com o macaco, ali...
E ó’ pois disse-lhe: - ‘Tão?(16) ‘Tás aqui com quem?
E ele disse: - Com a mãe...
- Onde é que ‘tá a tua mãe?
‘Pois foram. O senhor foi. Foi tudo. Viu-a. Ela sentada, lá naquele buraco, coitadinha, muito bonita, mas já muito velhinha, já... (…) E depois ele trouxe-a! Depois ele trouxe-a e fizeram uma vida… Diziam que nessas coisas acontecia isso, né?(17) Fizeram uma vida boa, *com a bebé(?)*, casou com a mulher novamente. E mandou matar aquela gente toda que fizeram com qu’ a(18) mulher abalasse(19). Criou o filho…
Idalina Cacito, Beja, Abril de 2010
Glossário:
(1) Magalona – mulher vistosa.
(2) Pa’ – “para” (em próclise, usadode modo informal e coloquial).
(3) Par’ - para (abreviatura oral, de uso informal e coloquial).
(4) Dent’o – dentro.
(5) ‘Tava –estava ( pronúncia popular do verbo “estar” conjugado).
(6) Qu’o – que o.
(7) Qu’a – que a.
(8) Pràs - “para as” (contração da preposição pra com o artigo ou pronome as; uso popular e coloquial).
(9) Brinhas – brenhas (pronuncia popular).
(10) Na’ – “não” (pronuncia popular, uso coloquial).
(11) G’ande – grande.
(12) Ó’pois – “depois” (modo informal e coloquial, reprodução da pronúncia).
(13) ´Pois – depois.
(14) Ma’ – ‘mas’ (supressão de uma vogal, abreviatura oral, de uso informal e coloquial).
(15) Me’mo – mesmo (pronúncia popular).
(16) ‘Tão? - então (uso informal e coloquial).
(17) Né? – não é? Contracção do advérbio ‘não’ e da forma verbal ‘é’ – “não é”?
(18) Qu’ela - “que ela” (abreviatura oral, de uso informal e coloquial).
(19) Abalasse – fosse embora.
Referências bibliográficas e recursos online utilizados no glossário:
http://alfclul.clul.ul.pt/clulsite/DRA/resources/DRA.pdf;http://aulete.uol.com.br;
http://aulete.uol.com.br;http://michaelis.uol.com.br;http://www.ciberduvidas.com;
http://www.infopedia.pt; http://www.priberam.pt;
José Leite de Vasconcelos/Centro de Linguística da Universidade de Lisboa. Dicionário de Regionalismos e Arcaísmos (DRA). p.720.
Nunes, José Joaquim. (1902). Dialectos Algarvios (Lingoagem do várlavento) (Conclusão). Revista Lusitana: Volume VII, Lisboa: Antiga Casa Bertrand. pp. 250.
Caraterização
Identificação
Contexto de produção
Contexto territorial
Contexto temporal
Património associado
Transmitidas aos serões, em quotidianos de trabalho e lazer.
Contexto de transmissão
Contadores de histórias que participam em iniciativas do Município de Beja. São convidados na iniciativa Palavras Andarilhas. Vão a escolas, lares e bibliotecas.