Inventário PCI
S. Pedro do Sul
"A mulher preguiçosa" - Apesar dos avisos, um homem casa com uma mulher preguiçosa. Constatando que a esposa come e bebe à larga e se recusa a trabalhar, o homem engendra um esquema para a pôr na linha.
António Oliveira, S. Pedro do Sul. Registo 2007.
Transcrição
A mulher preguiçosa
O malandro vive sempre à custa do trabalho dos outros. Sempre! Sempre. O malandro vive sempre do pão dos outros. E então um senhor que detestava isto casou com uma senhora fulana. E disseram para ele:
- Olha que tu não cases com ela, que ela é uma malandra como uma cadela velha! É mais malandra que uma cadela velha! Não cases com ela!
- Eu, cá disso! É malandra, o quê? Uma rapariga destas, um pancadão destes? Deus me livre! Tem umas mamas que parece duas leitarias! Tem um pão, uma padaria e um parque dos advertimentos que é de tirar o chapéu! Ah! Eu não quero saber que ela seja malandra! Uma mulher destas não é de despejar, é de a colher!
E então casou-se. Casou-se… Casou-se […] e tudo muito bem. Bem, e passado uns dias, o homem trouxe-lhe um bocadinho de presunto. Trouxe-lhe uma codinha… Aquilo também, era… Era assim apertado… Só matavam um porco por ano, porque os outros lavradores ao lado matavam seis e sete… E levou-lhe um copinho de vinho. Ela disse:
- Só me dás este vinho?
- Se tu quiseres eu tiro-te a caneca cheia…
- Pois, bota lá a caneca cheia!
Botou lá a caneca cheia. Acabou de comer e… tau! E diz a ele, diz ele:
- Bom, o meu pai tem caldo na panela, se tu quiseres eu vou-te lá buscar uma tigela dele.
- Então vai lá!
Foi lá. Ela… tau! Diz assim:
- Anda, agora tens a barriguinha cheia, vamos para o campo trabalhar.
E ela disse:
- O quê?! Ai, isso não é comigo!
- Ai não é contigo?
Disse:
- Pois não.
- Então fica aí.
Ficou. E dali para diante, ele: chave na adega; chave na salgadeira; chave na maceira e… – e a fome é negra…
E ela disse:
- Ah, e tal… Também, fechaste tudo…
- Tu não queres trabalhar, não te queres humildar! -diz. -És malandra como uma cadela velha! Era o que me diziam! E… E vês até, a saia que tu tens? A saia que tu tens está furada, daqui por mais um mês ou dois, estás… estás a amostrar as vergonhas! Não tens vergonha?
E disse:
- Está bem.
No Domingo seguinte, ele já viu a saia assim… assim meia desusada, e disse:
- Ó mulher, temos de ir comprar um porco à feira. Temos de ir comprar um porco à feira.
Diz:
- Ah, mas… a saia está velha…
Disse:
- Ó mulher, levas o meu capote! Deixas ficar a saia, o capote esconde tudo até ao lado, abotoa de lado, e tu levas o meu capote!
- Ó homem, está bem… Se assim é… O teu capote é novo e serve, ainda pode servir…
Ela chegou ao centro da feira, diz-lhe o gajo:
- Larga o capote e aprende a trabalhar, que estão ali os meus amigos e tenho de lhes dar de render visita!
- O quê, homem?!
- É verdade!
Ela tirou o capote, pôs uma mão direita – uma mão à frente e outra atrás – e vai e sai […] e fugiu pelo meio da feira fora, direita à casa. Chegou a casa, estava com duas tacas[1] e lambia, vira, vira, vira, vira, vira, vira, vira… O homem entra, diz:
- Ó mulher! Olha que isso vai grosso!
E diz ela para ele:
- Ai, vai grosso, vai… Grosso ou delgado: é para tapar a pá do rabo!
E começou a trabalhar!
[1][1] Agulhas de tricotar
António Oliveira , 2007, S. Pedro do Sul
Caraterização
Identificação
Contexto de produção
Contexto territorial
Contexto temporal
Património associado
Contexto de transmissão
Histórias e cantigas partilhadas nos tempos de lazer e em festas e romarias. Actividades promovidas pelo Município.