Inventário PCI
Beja
“O pranto da virgem”-Sobre a paixão de Cristo e o sofrimento de sua mãe
Mariana Bicho; Salvada; Ano de nascimento: 1938; Concelho de Beja.
Registo 2010.
Romance: Romances Religiosos: Tempo da Paixão: “As Novas da Crucifixão chegam à Virgem Maria” + “A Virgem a Caminho do Calvário” + “Testamento de Cristo”
Classificação: Isabel Cardigos (CEAO/Universidade do Algarve) em Setembro de 2011
Fonte da Classificação: Maria Aliete Galhoz em Idália Farinho Custódio, Maria Aliete Farinho Galhoz, Isabel Cardigos, Orações : Património Oral do Concelho de Loulé, vol. III, Loulé, 2008, CM Loulé, pp. 193-197.
Transcrição
O pranto da Virgem
«Esta oração que é o pranto da Virgem. Esta oração chama-se o pranto da Virgem. O pranto. O pranto. O pranto da Virgem.
‘Tando(1) Nossa Senhora, na sua missa rezando,
chegou Santa Badanela [Madalena], triste nova lhe foi dando:
? tens o teu filho morto, debaixo da pedra dura.
Já lá vai Nossa Senhora, na rua da amargura.
Dando ais, dando gemidos,
as mães que tiverem filhos, ajudarem-me a chorar.
Q’ aquelas que não os têm, na’ me sintem(2) no me’ mal.
Na’ têm golpes a sentir, nem tormentos a passar.
Logo ela encontrou, logo ela encontrar,
uma prima, irmã sua, uma prima, irmã dela.
— Na’(3) vistes aqui passar, filho deste meus olhos,
criado nesta alma minha? Que é tão lindo como(4) sol,
verdoso (?) como as estrelas?
—Os sinais que dais Senhora, por sorte, na’ seria.
Passou aqui à meia-noite ou meia-noite seria.
Levava uma cruz às costas, a cada passo caía.
Uma seta na garganta, pra(5) mais tormentos lhe dar.
Me pediu uma toalha, *pò se’*(6) rosto limpar.
Eu le d’i(7) esta mim touca, que aqui tenho entocada
dobrada em nove dobras, o se’ sangue não ‘taca(8).
—Que nova, tã’(9)triste nova, que entrou no me’s(10) ouvidos.
Já na’ ouço, já na’ ralho e me’s sentidos ‘tão perdidos!
Logo ali vide a S.Gens, um grande alívio lhe deu.
— Levantar daí, Senhora! Deitar os passos mei’ legos.
Vamos ver o bom Jesus: ‘tá no *monte dos Calvários*(11).
Com o sangue do seu peito, ‘tá fazendo testamento.
A São Pedro deixa as chaves, pràs porta do Céu abrir.
A São Miguel a balanças, pra toda as almas pesar.
À sua mãe o coração, que é pra s’ ela(12) consolar.
Quem souber a oração que a diga; quem la(13) ouve que a aprenda.
Lá no Dia de Juízo, havirá(14) quem la entenda.»
Mariana Bicho, Beja, Outubro de 2010
Glossário:
(1) ‘Tando – estando (pronúncia popular do verbo “estar” conjugado).
(2) Sintem – sentem.
(3) Na’ – não (houve supressão da acentuação e do o para reproduzir a pronúncia).
(4) Comó – como o.
(5) Pra – para (redução da preposição “para”usadade modo informal, reprodução da pronúncia).
(6) Pò se’ – para o seu (pò = forma sincopada de prò; se’ = seu: supressão do u para reproduzir a pronúncia).
(7) D’i – dei (houve supressão do e para reproduzir a pronúncia).
(8) ‘Taca – estancava (parava o fluxo de um liquido).
(9) Tã’ – tão (de tal modo).
(10) Me’s – meus (houve supressão do u para reprodução de pronúncia).
(11) Monte dos Calvários – monte do Calvário (monte próximo de Jerusalém onde os romanos realizavam as crucificações e onde Jesus foi crucificado).
(12) Pra s’ela – para se ela.
(13) La – ‘a’ (artigo definido a).
(14) Havirá – haverá.
Referências bibliográficas e recursos online utilizados no glossário:
Neves, Henrique das. (1897-1899). Glossário de palavras, locuções e anexins. Revista Lusitana, Volume V, Lisboa: Antiga Casa Bertrand, p.224.
http://aulete.uol.com.br;http://michaelis.uol.com.br;http://www.infopedia.pt;
Caraterização
Identificação
Contexto de produção
Contexto territorial
Contexto temporal
Património associado
Transmitidas aos serões, em quotidianos de trabalho e lazer.
Contexto de transmissão
Contadores de histórias que participam em iniciativas do Município de Beja. São convidados na iniciativa Palavras Andarilhas. Vão a escolas, lares e bibliotecas.