Inventário PCI
Relato sobre as assembleias entre freguesias e as lutas que se davam entre elas.
Histórias de vida (recordações da infância; passatempos coletivos)
Transcrição
- "As assembleias era a reunião. Claro, o pessoal não tinha televisão, nem telemóvel, nem nada e iam para ali. Por exemplo, aqui neste sítio. (...) Onde havia encruzilhadas, o pessoal reunia ali, conversava, destinavam as malandrices para ir roubar de noite fruta ou para ir às preladas ou para ir aos serões. E era ali que se resolvia as festas, os bailes. Chamavam-lhe assembleias. E era ali que (tratava?) tudo, isso era prática comum aqui e quase em todas as freguesias por aí."
- "Isso a gente não saía. A gente vivia aqui todos isolados."
- "Quando eu penso que íamos aqui pelo monte, de noite, para ir para um serão e eu levava o acordeão. Havia sempre um gajo que gostava de andar com o acordeão às costas, então é que levavam. Daqui para Sanfins, portanto, 4 quilómetros aí pelo monte acima ou mais. De noite e às vezes chovia. Havia carreiros, a gente sabia onde estavam as pedras, não tropeçavam nem nada. Agora até de dia no chão já um gajo tropeça.
Mas um gajo ir por aí acima. E eu quando penso que [era] só para estar sentado à beira de uma moça, por exemplo, um quarto de hora, porque depois vinham os de Gondomil e era à vez: agora fora os de Verdoeja, agora entravam os de Gondomil, depois entravam os outros. “
- "É, para namorar e para dançar havia aqueles regulamentos. E depois aí é que havia as pegas (...?) às vezes de serrafar mesmo."
- "O primeiro estoiro era para o candeeiro, que ficava tudo às escuras. Pronto, já estavam."
- "A coisa do primeiro murro é que se dava as pegas entre freguesias. Nós aqui com os de Friestas diz que chegaram, já os nossos antepassados, chegaram a combinar um embate aí uma noite, ali. «Nós marcamos, assim vós vinde de Friestas.», para combaterem ali, havia de ser à paulada ou não sei."
- "Tinha vindo de Lisboa eu, nos anos 56 para aí. Eu vim, andava por aí. Foi no primeiro batismo de contrabando que eu fui. À noite chegámos ali abaixo com um saco de café às costas - eu, o Júlio do Pepe e o Mário - por ali pela beira do rio e às tantas [ouve-se] um tiro. Caralho, nunca tinha ouvido um tiro. Fiquei atrapalhado de tal maneira que o Júlio, que é um gajo forte, teve que me levar a mim e ao saco, tudo, a atravessar o rio para o outro lado.
E no dia antes, à noite, havia uma moça lá, muito simpática, que dizia: «Á, Manuel...» e tal, como eu tocava acordeão, «nunca vais lá a cima..!» a Sanfins. Havia um moço aqui que namorava uma irmã lá. [Disse:] «Adão, vou contigo lá acima.». (...) Esse moço já tinha moça, já namorava há muito tempo com ela. Eu ia-me preparar para ir, para namorar com a irmã. Mas não, o que é hoje marido estava a namorar e depois ainda tinha 4 à espera. Como vinha de Lisboa não sabia daqueles truques, digo: «Como é que pode ser? Em quarto lugar? Não, vou-me já embora.». (...) Depois encontrava-me, ela, e eu dizia: «Ó, vai lixar outro.»"