Inventário PCI
História sobre uma mulher que tenta envenenar outra, mas acaba por envenenar os próprios filhos.
Conto Religioso (ATU 837 The Beggar’s Bread). Contado como caso real.
Transcrição
Lembro-me de uma mulher que vivia, chamavam-lhe, na Cavada Velha. (...) Era ela e uma filha. Quer-se dizer que era um lugarzinho antigo, eu passava muitas vezes por lá. A gente andávamos a pé e passávamos muitas vezes por ali, que era um atalho. (...) Era um lugarzinho, como outro qualquer, como nós temos. Temos as brandas as inverneiras. Quer-se dizer que aquele lugarzinho ficou sem gente, como agora, ficou sem gente, só vivia lá uma mulher e uma filha.
Então a mulher vivia lá e ia a Cerveira, quando pescava que a gente cozia ela ia à Cerveira buscar a tenda - a gente chamava-lhe a tenda, botávamos-lhe uma quantidade. Nós agora chamamos-lhe bolo, mas antigamente chamávamos-lhe a tenda. Então a mulher ia buscar a tenda lá. E havia lá uma senhora que tinha dois filhos (...) e ela, claro, cozia muitas vezes e ela calhava-lhe de ir lá.
Depois a mulher disse-lhe assim:
– Então que vá a tenda...
Já não me lembro bem o que ela dizia, mas ela dizia-lhe uma palavra e a outra mulher ficava chateada com aquelas palavras que ela lhe dizia, por lhe dar a tenda.
Ela queria-lhe dizer «obrigado», mas dizia na lenda dela. Agora não me lembro bem o que ela lhe dizia, mas pronto, dizia-lhe: «obrigado», mas na lenda antiga. E a mulher ficava chateada com o que ela lhe dizia. E depois disse assim:
– Deixa lá, que tu para a próxima vez vais-te encontrar (enganada?).
E a próxima vez que foi lá, a mesma lenda. Deu-lhe a tenda, mas deu-lhe a tenda envenenada. Botou-lhe veneno para a matar. Era má, a mulher era má, e tinha doze filhos.
Depois os filhos foram à caça a Cavada Velha, que era onde ela estava, e deu-lhes fome. Deu-lhes fome, abaixaram a casa dela, pediram-lhe um bocadinho de pão para matar a fome. Ela disse-lhes assim:
– Olhai, eu tenho aqui a tenda que tua mãe me deu, ainda está inteira. Ainda não a encetei, então enceto-a para vós. Eu dou-vos um bocadinho.
E deu-lhes um bocado para lhes matar a fome. Eles agarraram a tenda, comeram-na. Comeram-na. Mas como aquilo ficava perto (...) de Cerveira, os rapazes - eram dois irmãos - os rapazes foram para casa e iam a morrer. Comeram veneno, comeram a tenda envenenada que a mãe dera à senhora.
Depois ela disse assim:
– Vós que tivestes, meus filhos? Vós que tivestes?
– Olhe, a senhora da Cabana Velha deu-nos um bocado da tenda que você lhe dera. Estamos muito doentes, estamos a morrer.
E ela que pegou (antigamente para matar o contraveneno, botavam-lhe pela boca abaixo azeite e leite, para matar o contraveneno). Então botou-lhe azeite pela boca abaixo aos filhos, porque sabia bem que envenenara a tenda, porque eles disseram-lhe. Botou-lhe azeite pela boca abaixo, vomitaram e aquilo passou. E a mulherzinha soube, no mesmo dia soube que lhe fizera mal a tenda e atirou com ela, não a comeu. Não a comeu, já. Atirou com ela e disse assim:
– Ai sim? Do que me eu livrei!