Inventário PCI
Beja
“O rico e o pobre”- Sobre as diferentes condições sociais e as recompensas depois da morte
Mariana Bicho; Salvada; Ano de nascimento: 1938; Concelho de Beja.
Registo 2010.
Romance: Romances Devotos Vulgares: Lázaro e o Rico Avarento
Classificação: Isabel Cardigos (CEAO/Universidade do Algarve) em Setembro de 2011
Fonte da Classificação: Maria Aliete Galhoz em Idália Farinho Custódio, Maria Aliete Farinho Galhoz, Isabel Cardigos, Orações : Património Oral do Concelho de Loulé, vol. III, Loulé, 2008, CM Loulé, pp. 126-132.Transcrição
«Numa manhã *necetada* [necessitada] levantou-se um pobrezinho,
à porta do rico foi pedir esmola.
O rico lhe perguntou: — Que vens aqui fazer?
E ele le(1) respondeu: — Queria um bocadinho de pão para comer.
Logo foi, naquela hora, que o rico ia almoçar,
o rico, como soberbo, os cães lhe foi açudar(2).
A criada, como boa, o certo é ela ganhar.
Morreu o rico e o pobre, foram-se os dois enterrar,
o rico a um cantinho e o pobre ao pé do altar.
Na sepultura do rico nasceu um fogo infernal,
na sepultura do pobre uma fonte industrial.
? Bem podias tu, ó pobre, bem podias, se quisesses,
dar-me uma gotinha de água da tua fonte industrial.
Que as chamas deste me’(3) fogo e acho que elas abaixar.
? Deixa-te lá ‘tar(4), ó rico, lá no teu fogo infernal,
que as sobras do teu almoço nunca mas quisestes dar.
A criada, como boa, o certo é ela a ganhar.
— Quem me dera ir ao mundo! – Dizia o rico.
Quem me dera ir ao mundo! Quem me dera lá chegar!
Queria educar os me’s(5) filhos pra que nunca façam tal!
— Deixa-te lá ‘tar os te’s(6) filhos, deix’ ós(7) acabar de criar.
Lá há padres pregadores pòs(8) te’s filhos educar.
Mas isto é cantado e em todas as palavras diz assim:
Deixa-te lá estar, ó rico, nesse teu fogo infernal
e ai, Jesus!
É. Isto é cantado. Mas só que a minha voz na’…
[Informante 2:] ? Não, mas esse bocadinho já dá pa’(9) se perceber.
[Informante 1 (MB):] ? Na’ dá pra isso, ‘tá a ouvir?»
Mariana Bicho, Beja, Outubro de 2010
Glossário:
(1) Le – lhe (pronome, registo popular e modo informal).
(2) Açudar – açular (incitar os cães a morder).
(3) Me’ – meu (supressão da vogal u para reprodução da pronúncia, uso informal e coloquial).
(4) ‘Tar – estar (pronúncia popular deste verbo, uso coloquial).
(5) Me’s – meus (houve supressão da vogal u para reprodução da pronúncia, uso coloquial).
(6) Te’s – teus (houve supressão da vogal u para reprodução da pronúncia, uso coloquial).
(7) Deix’ós – deixa os (houve supressão do a de deixa e acentuação de os para reprodução da pronúncia).
(8) Pòs – para os, forma sincopada de prós (contração da preposição pra com o artigo ou pronome no plural os, uso popular e coloquial).
Referências bibliográficas e recursos online utilizados no glossário:
Barros, Vítor Fernandes, (2006). Dicionário do Falar de Trás-os-Montes e Alto Douro. Lisboa: Edição Âncora Editora e Edições Colibri, p.254.
Barros, Vítor Fernandes, (2010). Dicionário de Falares das Beiras. 1ª. Edição. Lisboa: Âncora Editora e Edições Colibri, p.243.
Nunes, José Joaquim. (1902). Dialectos Algarvios (Lingoagem do várlavento) (Conclusão). Revista Lusitana: Arquivo de Estudos Filológicos e Etnológicos Relativos a Portugal, (1ª Série), Volume VII, Lisboa: Antiga Casa Bertrand. pp. 250.
Vasconcelos, José Leite de/Centro de Linguística da Universidade de Lisboa. Dicionário de Regionalismos e Arcaísmos (DRA). Em linha, URL/PDF, p.720.
http://aulete.uol.com.br;http://michaelis.uol.com.br;http://www.ciberduvidas.com; http://www.priberam.pt
Caraterização
Identificação
Contexto de produção
Contexto territorial
Contexto temporal
Património associado
Contexto de transmissão
Contadores de histórias que participam em iniciativas do Município de Beja. São convidados na iniciativa Palavras Andarilhas. Vão a escolas, lares e bibliotecas.