Inventário PCI
Cantiga tradicional sobre um rapaz enamorado que se fingia de cego para vir falar à sua amada.
Romanceiro (IGR 0189 El ciego raptor); estrófico (redondilha menor)
Transcrição
- "Claro, ali era caminho de passagem, era um caminho de passagem. A gente passava por ali. Havia burros para andar a cavalo. A gente passava a cavalo.
Depois era uma rapariga solteira, uma rapariga nova. (...) Havia um rapaz que gostava dela, mesmo, gostava dela. Passava por ali a cavalo e ele botava-lhe mezinho a cavalo. Depois ele passava o cavalo, conversava com ela e depois dizia-lhe que fosse com ele, mas ela não ia. A mãe não a deixava ir. (...) Depois ele ia-se embora a correr e ela ia a correr atrás do cavalo. E a mãe só lhe disse assim:
«Ó minha filha, atira com o lenço, minha filha, atira com o lenço! Atira com o lenço que foge contigo, atira com o lenço!»
Mas depois atirou com o lenço, o lenço foi atrás do cavalo e ela ficou. O lenço foi atrás do cavalo, do indivíduo que ia a cavalo. E ela ficou. (...)
Elas viviam ali. E ele vinha de noite, fazia-se de cego. Fazia que era cego. E chegava à porta delas e botava-lhe uma cantiga. Chegava à porta da moça.
E eu sei esta cantiga, que ninguém a sabe:
- Acorda mãezinha se estais a dormir,
Está o pobre à porta a cantar e a pedir.
- Se canta e pede dá-lhe pão e vinho,
E se não quer que siga o seu caminho.
- Não quero do seu pão, não quero do seu vinho,
Quero que a menina me ensine o caminho.
- Acabou-se-me o linho e espiou-se-me a roca,
Vai-te embora cego que aí vai o caminho.
- Anda Aninha anda para a salinha além,
Que eu sou curto de vista, mas vejo-te bem.
Olha Aninha, olha o que lá vem:
Lindas carruagens que buscar nos vêm.
- Adeus minha mãe, adeus minha terra,
Adeus fraguinhas da Cabana Velha.
Ela diz-lhe essa cantiga ao lugar dela.
«Adeus minha mãe e adeus minha terra, adeus fraguinhas da Cavada Velha»
E eu, ensinou-me uma mulher velha, ainda eu era novinha, mas nunca mais me saiu da minha memória. Nunca mais. E não a sabe ninguém. Eu já lhe fui cantar ao padre. E [quando a cantei] ao padre, já assentou num livro. E cantei-lhe mais cantigas, não é? Mas esta era a mais importante para ele. Foi a mais importante que encontrou.
Esta é uma cantiga muito antiga, muito antiga, muito antiga. Muito, mesmo muito antiga. (...) Tem séculos. Isto tem séculos! Claro, houve pessoas que aprenderam e houve pessoas que não fizeram caso dela. Eu fiz! Mas houve pessoas que não.
E então a minha mãe, tinha que lhe cantar esta cantiga todas as noites, só me queria ouvir cantar esta cantiga. Então eu tinha que lhe a cantar todas as noites. Quando estávamos na casa à noite ela [dizia-me]: «Canta-me aquela cantiguinha que tu sabes, canta.». E só eu é que cantava a cantiguinha que eu vos apresento. Eu cantava-lhe mais, mas ela queria esta, gostava desta, porque (...) é uma cantiga muito bonita, tem uma moda muito bonita. E ela então gostava desta cantiga."