nome: Vila de amêijoas
projecto: Os gestos dos sabores
local: Portugal
acervo: Associação - As idades dos sabores
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Produto nobre do mar, as amêijoas são desde há muito indissociáveis da actividade humana nas orlas costeiras. A Ria Formosa, zona alagada pelas marés que estende por sessenta quilómetros da costa algarvia, é um bom exemplo. Por toda a Ria, os bivalves, fáceis de capturar e de simples confecção, foram e são amplamente consumidos e comercializados. 

Terão começado por constituir um complemento à parca e incerta actividade piscatória. Com os homens no mar, a sua apanha era uma tarefa das mulheres e das crianças. Só no início do século vinte terão surgido os viveiros e quem se dedicasse em exclusivo à sua exploração.

Considerado um produto valioso, a maior parte do que era apanhado servia para venda ou troca, designadamente entre as populações do mar e da serra algarvia, onde um saco de bivalves podia valer um saco de figos secos ou de grão.

Na Ria apanhava-se berbigão, cadelinhas, lingueirão e amêijoas de várias qualidades. As mais apreciadas reservavam-se para momentos especiais.

Foi neste contexto que surgiram as vilas de amêijoas. Utilizando a amêijoa-boa, este era o prato das celebrações pascais em Olhão, onde as vilas eram confeccionadas popularmente nas açoteias, servindo de pretexto para a reunião familiar e para disputas entre as casas pela melhor vila, as mais saborosas amêijoas e o melhor vinho. Os mais ricos, que também as apreciavam, preferiam o recato de passeios de caleche até às matas interiores, onde preparavam as suas “vilas”.

Na Fuzeta, as vilas estavam associadas à ida dos pescadores para as longas e perigosas campanhas do bacalhau. Antes da partida, rumavam em direcção à Igreja do Livramento para pedirem protecção e boa sorte. Depois da missa, homens, mulheres e crianças, festejavam com amêijoas, cozinhadas numa vila montada ali mesmo, no adro da capela.

As vilas de amêijoas constituem-se como símbolos de vilas de homens que, reunidos à sua volta, celebram e invocam os favores dos deuses, reconhecendo-se como comunidade na partilha dos alimentos que o mar e a terra propiciam.
 
  Receita

Ingredientes:
4 kg de amêijoa-boa
1 ou 2 limões (facultativo)

Acessórios:
Algumas pedras grandes, um capacho e mato seco (esteva, videira ou outros).

Confecção:
Colocam-se as pedras directamente no chão ou sobre uma superfície lisa e limpa, formando uma circunferência com cerca de 1 metro de diâmetro. No centro coloca-se outra pedra. A vila está pronta para ser «armada».
Dispõem-se as amêijoas em torno da pedra central, com a «boca» (abertura) virada para baixo, compondo-se circunferências sucessivamente maiores. Deve ter-se o cuidado de deixar as amêijoas bem juntas e apertadas.
No fim do processo a «vila» deverá parecer-se com um círculo de amêijoas ordenadas em filas concêntricas em torno de uma pedra, sem espaços entre elas; a fiada de pedras exterior deve ajeitar-se, para segurar o conjunto.
Cobre-se a «vila» com mato seco, tendo o cuidado de não se tirarem as amêijoas do lugar. Ateia-se fogo e espera-se que as amêijoas abram. Quando o mato tiver ardido, afastam-se as cinzas com a ajuda de um capacho para se poderem tirar as amêijoas, que se comem imediatamente, ao natural ou com umas gotas de sumo de limão.