nome:
Maria Bernardina
ano nascimento:
1939
freguesia: Mora
concelho:
Mora                                   
distrito:
Évora
data de recolha: 2007
 
 

Inventário PCI

O rapaz porco

Mora

"O rapaz porco" - Um rapaz nasce encantado e só a persistência de uma esposa lutadora lhe quebra o feitiço e permite uma vida de felicidade a dois.

Maria Bernardina; Mora; Concelho de Mora, Évora

Registo 2007.

O Rapaz-Porco: ATU 433 B O Rei Lindorm + ATU 425 A O Monstro (Animal) como Noivo (Cupido e Psique)

 

Classificação: Paulo Correia (CEAO/ Universidade do Algarve) em Junho de 2007.

Transcrição

O Rapaz-Porco

 

Era uma senhora, também na' tinha filhos, e atão, um dia, disse:

– Ó Me' Deus! Quem me dera ter um filho. Nem que fosse um porco gordo!

Realmente ela teve esse filho – o porco gordo.

E, atão, o porquinho gordo, um dia 'tava à janela e viu passar um casamento.

Porco – Ó mãe! Que é aquilo que vai além?

Mãe – É um casamento, filho!

Porco – Ah! Atão, eu também quero casar!

Mãe – Ó filho! Atão tu és um porco gordo... Quem é que quer?

Porco – Quem é que quer?! A filha do sapateiro. A mais velha! Vai lá pedir ao sapateiro pa' me dar a filha!

Lá moeu a mãe. A mãe foi ao sapateiro, pa' dar a filha.

Mãe – Olhe, o meu filho quer que você case a sua filha. Que ele quer casar com ela.

Casaram. Mas ele, nessa noite, matou a filha!

No outro dia, a mãe chegou lá:

– Ó filho! Olha o que tu fizestes!

Porco – E agora quero casar, outra vez.

Mãe – Atão tinhas uma mulher – mataste-a. Agora queres outra?

Porco – Quero! Quero a filha do sapateiro, a do meio! Vá lá pedi-la, que ele... Ele dá-me a filha!

Lá foi lá a mãe chatear o sapateiro. O sapateiro muito zangado, mas lá lhe deu a filha.

E ele fez-lhe o mesmo! O porquinho gordo fez-lhe a mesma coisa!

Mãe – Ó filho, atão tu fizeste um trabalho destes outra vez!

Porco – E agora quero casar, outra vez!

Mãe – Não pode ser! Atão, já tiveste duas mulheres, mataste-as!

Porco – Mas vou casar com a filha do sapateiro, com a mai' nova!

Assim foi. Naquele dia casaram. Á noite, ele disse pra ela:

– És capaz de despir sete saias, enquanto eu dispo sete peles?

Moça – Vou tentar.

Ela despia uma saia, ele despia uma pele. Ao fim das sete, um príncipe lindo, lindo, lindo – encantado. Lindíssimo! E diz-lhe pra ela:

– Tu agora não contas o segredo! – Se a gente tiver um segredo, a gente vai contar já, não é? – Tu agora não contas o segredo a ninguém! Este segredo é só nosso!

Mas... Chegou lá a mãe dela (porque pensou que a filha 'tava morta e 'tava bem viva!):

– Ó filha, como é que foi!?

Moça – Não! Não posso contar.

Mãe da moça – Ah filha, mas é só pra mim!

Assim que ela contou à mãe, ele apareceu logo. Apareceu e disse:

– Agora, perdeste-me para sempre! E se me quiseres ir achar tens de ir correr mundo.

E ela, coitadinha, correu mundo. Correu, correu... Já tinha os pés já feridos e já tudo e não conseguia achar o príncipe encantado dela (que era lindíssimo). E atão, um dia, ela passou e procurou ao Sol se viu o príncipe. O Sol disse que não.

Procurou à Lua – também não. Também, ninguém viu. Procurou à prima da Lua:

– Também não vi.

E atão, olha, procurou ao Vento: "pode ser que o vento saiba". E atão procurou ao Vento. E o Vento disse:

– Olha, esse homem 'tá pa' casar amanhã! Eu passei lá hoje, fiz um grande pé-de-vento.

– Vento d'um cabrão! Vento de um corno! – Que é o que a gente, às vezes, costuma também dizer. Isto o conto é contado assim, né? – E atão, no fim, ficaram zangados comigo, que eu enchi-lhe os bolos de pó!

E atão no caminho, antes dela lá chegar, encontrou uma velhinha. E a velhinha disse:

– Olha, levas este faqueiro que ainda te vai ser preciso. E leva daqui esta toalha muito bonita, que também te vai ser precisa. – E assim foi. Ela foi.

E o senhor casou. E ela disse-lhe, quando lá chegou à noite, pa' senhora que tinha casado com o príncipe:

– Olha, a senhora deixa-me dormir uma noite co o seu marido?

2ª. Esposa – Ai! Ainda hoje casei e agora já vai dormir uma noite com o meu marido! Não. Ainda hoje casei! – E não quis.

Moça – Oh, mas eu dou-lhe esta toalha, que é tão bonita!

E disse assim a empregada:

– Ah! Deixe lá! Ela dá-lhe a toalha, que é tão bonita, e a senhora fica ca toalha.

E assim foi. Mas ela deu-lhe o chá das dormideiras, o senhor deixou-se dormir nunca mais (...) ela falava pra ele e ele não ouvia! Mas, por baixo, tinha um cocheiro (que era uma coisa de cavalos) e, atão, ela dizia pra ele:

– E não te lembras disto? Não te lembras daquilo? Na' te lembras assim? Na' te lembras assado?

E ele na' respondia, porque 'tava a dormir na' ouviu.

Mas o cocheiro, em baixo, ouviu e dizia assim:

– Ó patrão? Atão, o que é aquilo?! Esta noite era a sua mulher a falar e você na' ouvia? "Na' te lembras disto e daquilo? E disto e..."

E ele começou-se a recordar de tudo, do que é que tinha dito pa' outra senhora.

Porco – 'Tá bem!

Nesse dia, à noite, apareceu lá a mulher outra vez:

– Olhe lá, deixe-me dormir mais uma noite co seu marido!

2ª. Esposa – Já? Outra vez?! Você dormir mais uma noite com o meu marido? Atão, na' vê que não?

Moça – Mas eu dou-lhe este faqueiro! É muito bonito.

Mas a empregada – Ah! Dá-lhe o chá das dormideiras e ele fica lá a dormir à mesma.

E assim foi. E ela disse assim:

– Olha, beba lá o chá das dormideiras!

Porco – 'Tá bem. Põe aí que eu já bebo.

Mas ele despejou o chá pra dentro do penico e na' bebeu.

E ela falou com ele:

– Olha, na' te lembras disto?

Porco – Lembro.

Moça – Na' te lembras assim?

Porco – Lembro.

Moça – Na' te lembras assado?!

Porco – Lembro!

Tudo! Quer dizer, aquilo que ela dizia, ele lembrava-se de tudo.

Porco – Atão, 'tá bem. Depois já não abalas daí!

No outro dia, 'tava na hora do almoço, 'tavam a almoçar e disse assim:

– Ó padrinho! Eu tinha uma chave velha e agora tenho uma chave nova. O que é que pertence ficar a servir? É a chave velha ou a chave nova?

Padrinho – È a chave velha.

Porco – Tome lá a sua filha que eu na' me servi dela! – Entregou a filha ao pai (que na' se tinha servido) e ficou com a chave velha que era a mulher antiga.

E atão eles ficaram assim: felizes para sempre. E ficaram contentes! Mas ela correu muito, muito, muito... Primeiro que ela conseguisse chegar e apanhar! Mas lá na Graça de Deus, lá o apanhou!

Deus seja louvado e este conto 'tá contado!

 

Maria Bernardina, Mora, Junho de 2007

 

Caraterização

Identificação

Tradições e expressões orais
Manifestações literárias, orais e escritas
O rapaz porco
1939
Maria Bernardina

Contexto de produção

Contexto territorial

Mora, Casa da Cultura de Mora
Mora
Mora
Évora
Portugal

Contexto temporal

2007
Hoje sem periodicidade certa. Encontros informais e iniciativas do Município de Mora e escolas

Património associado

Transmitidas aos serões, em quotidianos de trabalho e lazer.

Contexto de transmissão

Estado da transmissão
ativa
Descrição da transmissão
Agentes de tramissão

Contadores de histórias participam em iniciativas do Município de Mora. São convidados para participar na inicativa Palavras Andarilhas. Vão a escolas, lares e bibliotecas. Participam em iniciativas do Fluviário de Mora e da Casa da Cultura. Destacam-se as seguintes actividades desenvolvidas desde 1999:

 

- Encontro de Contadores e Histórias - 1999 a 2005

- Ti Tóda - Conta-me eum conto, estafeta de contos - 2001 a 2004

- As lendas vão à escola - 2005

- O Talego Culto - 2007

- O Talego ambiental - 2007 a 2008

- Comunidade do Canto do Lume

Idioma
Português

Equipa

Transcrição
Maria de Lurdes Sousa
Registo vídeo / audio
José Barbieri
Entrevista
José Barbieri
Inventário PCI - Memoria Imaterial CRL