nome: |
Tia Desterra |
ano nascimento: |
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freguesia: | Póvoa de Varzim |
concelho: |
Póvoa de Varzim |
distrito: |
Porto |
data de recolha: | 2007 |
- A abantesma e a mulher
- A abantesma e o homem
- A bruxa às canichas
- A bruxa e o peixe
- A esposa bruxa
- A tia ressuscitada
- Alma penada na igreja
- Ceia de Natal
- Diabo preso
- Latinórios
- O bezerro maldito
- O diabo e o Adolfo
- O diabo na igreja
- O diabo no muro da igreja
- O espírito mau no morro
- O fim das bruxas
- O peixe grande
- O voo do namorado
Póvoa de Varzim "Alma penada na Igreja" - Relato de uma mulher que encontrou almas penadas dentro da igreja de madrugada Ti Desterra, Póvoa de Varzim, Registo 2007 Muitos anos atrás… Sei lá, cem anos atrás! Eu tenho 67… (Antigamente falava-se de muita coisa, no meu tempo ainda se falava de muita coisa. Ainda provei alguma, vá. Diz que não, ninguém queria acreditar; tudo bem: não queria acreditar quem não passou. Agora, quem passa, acredita.) As pessoas, claro: logo que tocasse as trindades, ninguém saía de casa. Ninguém, com medo. Andavam as almas a fazer penitência. Logo que tocasse as trindades, já o diabo andava à solta… E então que faziam? Logo que escurecesse, todo o mundo se fechava em casa. Ninguém saía à rua. Comiam o caldinho, lavavam os pezinhos – cama! Ora: quem se deitasse às sete horas da manhã, – da noite – quando chegasse à meia-noite, já tinha cinco horas dormido! Uma vez, uma mulher disse: - Fulano! -para o homem. -Eu amanhã vou-me levantar cedo porque tenho de moer. Moer, que é o moinho: caga aqui o caganito, a moagem; moer o milho, que era para coser. Os pescadores cosiam todos, punham assim uma tábua nos cabos, pendurados – chamavam o balaio. E abriam a porta ao fogo e botavam ali o pão para não ressoar dentro do forno – diziam eles, para não ressoar. E botavam ali o pão. (Na nossa casa não podia ir para lá o pão, senão o meu pai, ao outro dia, não tinha nada. Mas prontos; o meu pai, aí, fechava o pão. Senão estava desgraçado, o homem. Havia filho que comia um pão de cada vez.) E então a mulher, chegou àquela hora, claro: acordou estremunhada! - Ai, já dormi tanto! -não sei quantos… Pega na saca, bota à cabeça e vem. Ela morava ao Norte, no Ramalhão, que é perto da Tourada. Ali chamavam o Ramalhão. Era a Rua do Norte. Com a saca a cabeça, vem, vem, vem… Vem por aqui – que ela depois ia por aí abaixo, para ir… (Isto agora tem umas estradas, mas naquele tempo não era assim. Ainda me lembro muito bem, que ainda é do meu tempo.) E a mulher chegou ali… aqui à Misericórdia… e viu muita gente à porta da igreja. A igreja aberta para trás. Diz ela: - Ai… Uma missa. Vou aproveitar, hás-de ser tu o que Deus quiser. Olha, se não for a primeira, sou a segunda. Também, não venho sem moer o milho. Pousou aquilo – a saca ao chão – e entrou para dentro da igreja. Olhou para o altar-mor… não viu ninguém. Aquelas luzes… aquelas luzes de azeite, naquele tempo era tudo alumiado em azeite. - Ai, o padre nunca mais vem, valha-me Deus… -a olhar para os homens, para as mulheres… Não conhecia ninguém. - Ai, Jesus… Às tantas, a mulher, como viu que o padre nunca mais aparecia, chega à beira de um homem e disse assim… Ela, para botar a saca ao chão, ela botou! Agora, para a levantar para a cabeça, não podia! - Olhe, moço… Bote-me aqui uma mãozinha à saca… Diz ele: - Olhe, eu não posso… Porque eu morri tuberculoso, sabe? Mas vá aquele ali, que ele morreu no mar e morreu com toda a força, com toda a valentia dele. A mulher não reflectiu! Chega à beira do outro e disse: - Ó moço, bote-me aqui uma mãozinha à saca… Diz ele: - Eu não posso… Porque eu morri no mar, sabe? E antes de morrer, sofri muito. Mas vá àquele, que morreu de desastre – foi instantâneo – e esse aí pode ajudá-la. A mulher pôs-se a pensar: - Se aquele morreu tuberculoso e este morreu no mar e aquele morreu de desastre… -por ali adiante! Não pegou na saca, deixou lá a saca: toca a correr por quantas tinha! E fugiu directamente para casa! Chegou a casa, bateu à porta e o homem assim: - Já vens? - Ó, meu rico homem, anda depressa aos mortos, que levam o milho para o cemitério! Anda num instante comigo! - Que mortos?! Estás tola? - Ó homem… Então, meu rico homem… Porque ali havia um cemitério. Ali era um cemitério. - Então, homem… Eu pensava que era uma missa, meu homem… Ia ouvir aquela missinha, que eu depois ia moer o milho! E então, no fim, eu não peço… Não houve missa nenhuma, o padre não apareceu! E então pensei que o padre estivesse doente. E não vou para um, não me diz que morreu tuberculoso, o outro morreu no mar e mandam-me daí para o outro que tinha morrido de desastre? Ó meu rico homem, anda depressa comigo buscar a saca! Vai-nos levar o milho para o cemitério! - Não, não vou, mulher. Quanto eu havia de ir! Não, que eu não sou tolo! Mas a mulher, diz que foi um susto – isso aí contava a minha mãe, que já era de mães a contar – diz que apanhou um susto para toda a vida dela. Actividades promovidas pelo Município da Póvoa de Varzim, Biblioteca Municipal e Museu Municipal de Etnografia e História da Póvoa de Varzim. Comunidade piscatória da Póvoa de Varzim
Inventário PCI
Transcrição
Alma penada na igreja
Caraterização
Identificação
Contexto de produção
Contexto territorial
Contexto temporal
Património associado
Contexto de transmissão
Equipa