nome: |
Mariana dos Santos Pacheco (Mariana Bicho) |
ano nascimento: |
1938 |
freguesia: | Salvada |
concelho: |
Beja |
distrito: |
Beja |
data de recolha: | Outubro 2010 |
- 5ª feira das endoenças
- A bela Infanta
- A filha varão
- A mulher do maioral
- A Rosinha costureira
- Aprender a contar
- As 3 filhas
- Deolinda e o patrão
- Hortense e o rapaz
- Juz juiz divinal
- Mulher sempre deitada
- O pranto da virgem
- O rapaz da bicicleta
- O rico e o pobre
- Oração de S.Gens
- Oração do início do dia
- Passeando D.Maria
- São gritos ao Calvário
- Senhora do Carmo
Beja “A filha varão”- Um rei não têm filhos. Sua filha mais nova disfarça-se de homem e peleja durante sete anos na guerra. À excepção do filho de uma capitão, ninguém desconfia que ela é mulher, mas este homem não desiste de tentar saber a verdade porque acha que o “barão” tem olhos de mulher… Mariana Bicho; Salvada; Ano de nascimento: 1938; Concelho de Beja. Registo 2010. Romance: A Donzela Guerreira Classificação: Isabel Cardigos (CEAO/Universidade do Algarve) em Setembro de 2011 Fonte da classificação: Aliete Galhoz em Idália Farinho Custódio, Maria Aliete Farinho Galhoz, Isabel Cardigos, Orações : Património Oral do Concelho de Loulé, vol. III, Loulé, 2008, CM Loulé, pp. 82-89. [A filha varão] – Ai, de mim, que já estou velho, e as guerras me vencerão, sete filhas que aqui tenho, sem nenhuma ser barão. Respondeu logo a mais nova, com tamanha descreção(5). – Venham armas e cavalos, que aqui ‘tá(6) se’(7) filho varão. – Filha, tens os pés pequenos, a conhecer-te vão. – Meteríamos umas botas, que de lá na’ sairão. – Filha, tens as mão pequenas, a conhecer[-te vão]. – Meterias numas luvas, que de lá não sairão. – Filha, tens os peitos grandes, a conhecer-te vão! – Meteria num espartilho, que de lá não sairão. – Filha, tens os olhos ramudos(9), a conhecer-te vão. – Quando olharem para mim, inclinarei-os prò(10) chão. E lá abalou prà guerra! Montada num cavalo. Mas havia um, que era o filho do capitão, que dizia que ela que era mulher e homem não! E atão ia prà mãe, dizia-le(11) assim: – Ó minha mãe, minha mãe, minha mãe do coração, os olhos de Dom Barão são de mulher, de homem não. – Convida-o tu, ó me’ filho, para contigo jantar, se for mulher, homem não, que se há-de envergonhar. – Convida-o tu, ó me’ filho, para contigo jantar, se for mulher, homem não, o pão ao pe’to(12) há-de arrumar. Mas Dom Barão, como esperto, o pão ao peito na’ arrumou, sem o ficar o conhecer, pà(13) sua guerra voltou. – Ai minha mãe, minha mãe, minha mãe do coração, os olhos de Dom Barão são de mulher, de homem não. – Convida-o tu, ó me’ filho, para contigo ir à feira, se for mulher, homem não, eleva-se na[s] fitas vermelhas – Pràs senhoras se enfeitarem, lindas espadas e grilhões para na guerra brilhar. – Ai minha mãe, minha mãe, minha mãe do coração, os olhos de Dom Barão são de mulher, de homem não. Convida-o tu, ó me’ filho, para contigo dormir, se for mulher, homem não, de ti se há-de encobrir. Mas Dom Barão, como esperto, à frente se foi deitar, pondo um lenço ao meio, na’ se puderam arrumar. – Mãe! Ó minha mãe, minha mãe, minha mãe do coração. os olhos de Dom Barão são de mulher, de homem não. – Convida-o tu, ó me’ filho, para contigo nadar, se for mulher, homem não, de ti se há-de envergonhar. Depois, quando foi pra ir nadar, puxa por um lencinho e na’ foi prò banho, pois com certeza! Na’ foi prò banho e ele disse: – Que tens ó Dom Barão, que ‘tás tão triste a chorar?! – Os sinos da minha aldeia, que soam aí a dobrar…, o me’ pai que já morreu, e a minha mãe ‘tá a falecer. E atão, se me queres saber quem eu sou… – Nessa altura declarou-se. E atão abalaram os dois. Chegou à mãe, disse: – Ó minha mãe, minha mãe, uma coisa lhe vou contar, trago um marido para mim, e um genro para lhe dar. – [Risos]. Sete anos andei na guerra, na guerra de Mavinhão, ninguém ficou sabendo se era mulher, homem não, senão o filho do capitão. – Pois, ele na’ a deixava! Via que nos olhos dela que era mulher e não homem.» Mariana Bicho, Beja, Outubro de 2010 Glossário: (1) Prà – para a (contração da preposição pra com o artigo ou pronome a; uso popular e coloquial). (2) Atão – então, regionalismo de Portugal, de uso informal e coloquial. (3) Na’ – não (houve supressão da acentuação e do o para reproduzir pronúncia popular, uso coloquial). (4) Me’ – meu (supressão da vogal u para reprodução da pronúncia, uso coloquial). (5) Descreção – discrição (relato, enumeração). (6) ‘Tá – está (pronúncia popular do verbo “estar” conjugado, uso coloquial). (7) Se’ – seu (houve supressão do u para reprodução de pronúncia, uso coloquial). (8) Pra – para (redução da preposição “para”, sua forma sincopada,usadano registo popular, informal). (9) Ramudos – densos (sugestão: pestanudos). (10) Prò – para o (contração da preposição pra com o artigo ou pronome o; uso popular e coloquial). (11) Le – ‘lhe’ (pronome, registo popular e modo informal). (12) Pe’to – peito (houve supressão do i para reproduzir a pronúncia popular). (13) Pà – para a (forma sincopada de prà – contração da preposição pra com o artigo ou pronome a –, uso popular e coloquial). (14) Nisto e naquilo – nestas e em outras coisas, neste caso específico. (15) À da – ir à casa de alguém (aqui refere-se à casa da mãe). Expressão recorrente no Alentejo. (16) Ma’ – mas (houve supressão do s para reprodução de pronúncia, uso coloquial). Referências bibliográficas e recursos online utilizados no glossário: Barreiros, Fernando Braga. (1917). Vocabulário barrosão. Revista Lusitana, Volume XX, Lisboa: Livraria Clássica Editora, Lisboa. p. 141. Barros, Vítor Fernandes & Guerreiro, Lourivaldo Martins. (2005). Dicionário de Falares do Alentejo. Porto: Campo das Letras p.38. Barros, Vítor Fernandes, (2006). Dicionário do Falar de Trás-os-Montes e Alto Douro. Lisboa: Edição Âncora Editora e Edições Colibri, p.254. Barros, Vítor Fernandes, (2010). Dicionário de Falares das Beiras. 1ª. Edição. Lisboa: Âncora Editora e Edições Colibri, p.243. http://aulete.uol.com.br;http://michaelis.uol.com.br; http://motoxaparros.webs.com/comodizquedisse.htm; http://www.ciberduvidas.com;http://www.infopedia.pt; http://www.priberam.pt Transmitidas aos serões, em quotidianos de trabalho e lazer. Contadores de histórias que participam em iniciativas do Município de Beja. São convidados na iniciativa Palavras Andarilhas. Vão a escolas, lares e bibliotecas.
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